(…) "Autismo envolve um estilhaçamento nas capacidades", diz Joel Smith, director executivo da Associação de Serviços ao Autista, em Wellesley, Mass. "No retardamento mental" continua ele, "o desenvolvimento é de um nível baixo como um todo. Mas em autismo, você tem algumas áreas com níveis muito, muito alto e outras de baixo". E é nessas áreas de nível elevado em que eles resolvem problemas matemáticos, quebra-cabeças e realizam tarefas complicadas e aparentemente sem solução.
Um belo dia, foi descoberto que os autistas apresentam enorme afinidade para actividades concretas. Aliás, quanto mais concreto e repetitivo for o trabalho, tanto melhor! É aí, exactamente nesse ponto, que entra o computador. Essa fabulosa ferramenta tecnológica se mostra extremamente amigável aos olhos dos autistas, pelo fato de apresentar uma lógica rígida. A resolução de um problema em determinado programa de computador aparece quase sempre igual, como numa equação matemática. Alguns autistas chegam, inclusive, a se definir como computadores que simulam o ser humano, descodificando o mundo externo como a máquina o faria. Aí fica fácil, porque se trata de um instrumento tranquilamente adaptável à forma que essas pessoas tão especiais têm de ver e compreender o mundo.
Por contarem com um pensamento estritamente visual (visualização vívida), um alto poder de concentração e uma óptima memória, os autistas podem fazer do computador seu ganha-pão, e se utilizam da Internet para travar relações com o que lhes é mais apavorante: o mundo externo. O trabalho no computador se caracteriza por ser essencialmente solitário, daí a afinidade. Além disso, pela dificuldade em manter contacto interpessoal, muitos autistas estabelecem relações sociais via e-mail.
Temple Grandin, que também é autista, descreve sua memória como sendo em forma de imagens e diz poder visualizá-las como se estivesse em uma página da Web . O pensamento dessas pessoas incrivelmente capazes é puramente visual, tal qual uma tela do Windows ou uma página da Internet. Qualquer informação muito gráfica, ou seja, que contenha muitas imagens, é rapidamente armazenada por eles. E nas palavras de Grandin, "eu não posso imaginar um envelope marrom se nunca tiver visto um antes".
Quando o computador passa a fazer parte do universo interno e inacessível do autista, ele se torna um poderoso instrumento de trabalho. Sara R. S. Miller é programadora de computador com habilidade para detectar qualquer problema no código binário, desde que já tenha visto aquele programa pelo menos uma vez na vida. Ela tem 42 anos, é presidente da Nova Systems em Milwaukee e é autista. Sara diz que sua visão do mundo é uma interpretação preta-e-branca da realidade, assim como no computador, que só existe o on e o off, sem o meio-termo.
Autistas com as mesmas potencialidades de Sara muitas vezes ficam de fora do mercado de trabalho de informática devido ao desconhecimento das pessoas quanto a esta habilidade, além da própria dificuldade dos portadores de Autismo em interagir socialmente. Eles dizem que o computador e a Internet podem proporcionar e facilitar uma melhor participação deles no mercado de trabalho, na construção de senso de valores e bem-viver.
Assim se torna fácil compreender a afirmação de Martijin Dekker, autista de 23 anos, que se diz obcecado por computador desde os 11 anos de idade. Através da máquina, ele utiliza capacidades que poderiam ser esquecidas, se não fosse a tecnologia. Tecnologia essa que, quando associada à Internet, rompe as barreiras do corpo-humano, aproxima aqueles que distanciam geográfica e fisicamente, traz à tona o intelecto. Dekker controla um grupo de apoio aos autistas na Internet. "Grupos como o meu parecem concordar com o mito de que autistas não querem contacto humano, mas, ao contrário, os grupos e a Internet nos mostram que somos capazes de formar contactos muito profundos e significativos", diz ele.
No sentido de reinserir essas pessoas ao convívio social e ao mercado de trabalho, o computador é um instrumento poderoso. Graças a ele e à Internet, os autistas tem uma nova possibilidade de mudar seu destino de abandono e não-aproveitamento de suas capacidades especiais.
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